A medicina, nos últimos anos, vem sofrendo com as constantes demandas intituladas como “erro médico”, o que o Prof. Genival Veloso de França denomina de “grandes conflitos”. Sem sombra de dúvidas, tais demandas resultam da quebra da relação do médico com seu paciente, assumindo um caráter puramente mercantilista. A luz do Direito, a relação jurídica formada entre o médico e seu paciente é considerada uma locação de serviços “sui generis”, agregando à prestação remunerada dos serviços médicos um núcleo de deveres extrapatrimoniais, essencial a natureza da avença

O homem contemporâneo, a cada dia que passa, torna-se um ser menos tolerante com os danos que sofrem, sejam eles de qualquer natureza, inclusive médicos, que a todo momento, sofridas agruras, reivindica seus direitos, sabedores que destes o são, fruto de um relacionamento médico-paciente cada vez mais enfraquecido.

Desta forma, surge a responsabilidade civil como tema de suma importância, por estar ligado à vida que, conforme previsão da Carta Maior de 1988, em seu artigo 5º inciso X, é inviolável. Portanto, é dever do médico empregar com zelo, diligência e cuidados suas técnicas e conhecimentos ao intervir na saúde do paciente, como bem prevê o Código de Ética Médica de 2019. Segundo Miguel Kfouri Neto, o erro médico pode causar danos irreparáveis para as quais não existe indenização capaz de pagar, haja vista estar envolvido em agressões infringidas contra os sentimentos e a autoestima do paciente e a própria vida.

Nos Estados Unidos da América do Norte, avolumam-se processos de erros médicos. A cada ano que passa centenas de processos são julgados nas cortes americanas, onde já despontam como o país que mais processa médico.

A situação no Brasil não tem sido tão diferente, pois é cada vez mais crescente as demandas de processos por erro médico.

No Estado do Pará, à semelhança de outros Estados da Federação, tem havido, também, um crescimento das demandas contra profissionais médicos no tocante a insatisfação do paciente ante um resultado danoso.

O ato anestésico é de responsabilidade daquele profissional médico que detém o título de especialista em anestesiologia. Somente este profissional é que está habilitado a realização do procedimento anestésico, portanto, é intransferível. Em antiga disposição, o Conselho Federal de Medicina já se manifestava que os resultados lesivos do ato anestésico pertencem, direta e pessoalmente, aos médicos autorizados a praticá-lo. Logo, as consequências de uma conduta anestesiológica danosa é de total responsabilidade desses especialistas.

Décio Policastro, em seu livro intitulado de “Erro Médico e suas consequências jurídicas”, relata que a responsabilidade do anestesiologista começa antes do ato operatório, no momento da avaliação pré-anestésica (pré-operatório), porém se alonga por todo o ato operatório até o momento em que, ainda na sala de recuperação anestésica, o paciente retoma a sua consciência e mantém estáveis as suas condições vitais, com ou sem auxílio de respirador artificial. Contudo, é recomendável que nos casos em que o

paciente necessite ser encaminhado na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI), que seu médico anestesiologista o acompanhe até aquela Unidade. Não se pode deixar de lembrar que em qualquer momento, quer na etapa pré-anestésica, quer na etapa anestésica e na pós-ánestésica possa ocorrer acidente anestésico indesculpável. A atividade anestésica é a que mais se apresenta com autonomia em relação aos demais médicos.

A Organização Mundial de Saúde, em 2005, criou a Aliança Mundial para a Segurança do paciente, estabelecendo seis metas gerai de segurança:

1- Identificar os pacientes corretamente;

2- Melhorar a eficácia da comunicação entre os profissionais envolvidos com o paciente;

3- Melhorar a segurança de medicações de alto risco;

4- Assegurar cirurgias com local de intervenção, procedimento e pacientes corretos;

5- Reduzir risco de infecções associadas aos cuidados de saúde;

6- Reduzir o risco de lesões ao paciente decorrentes de quedas.

O Juiz de Direito Jurandir Sebastião, em sua obra intitulada Responsabilidade médica – Civil, criminal e ética, leciona que “A natureza humana reserva segredos que ainda se conservam fora do alcance da medicina”. Portanto, muito embora a conduta do anestesiologista seja de obrigação de resultado, salvo nos casos de urgência, para caracterizar a culpa daquele profissional será necessário que o mesmo tenha atuado com negligência, imprudência, imperícia, se estabelecer o nexo de causalidade e o dano resultante. Em suma, a Responsabilidade Civil do médico anestesista só será atribuída após o devido processo judicial-constitucional, culminando com a obrigação de indenizar o paciente pelos danos causados em virtude do seu erro.

A literatura médica e jurídica tem elencado alguns erros cruciais, como sair da sala de cirurgia, anestesiar dois pacientes ao mesmo tempo, deixar de informar o paciente sobre possíveis riscos, assim como deixar de fazer uma boa anamnese pré-anestésica e assim deixar de colher informações importantíssimas para o bom resultado anestésico, evitando-se danos irrecuperáveis. A exemplo deste último, há um número razoável de processos de crianças que entraram andando e saíram vegetando por todo o resto de suas vidas, tudo porque o médico anestesista não tinha conhecimento de quadros alérgicos do seu paciente, exatamente por só ter conhecimento do seu paciente na sala de cirurgia.

Não há profissão sem risco. Entretanto, a medicina cuida do bem mais valioso do ser humano, a vida. Logo, todo e qualquer cuidado nunca será demais. Conhecer o paciente antes do ato operatório é um dever e obrigação, um bom relacionamento com o paciente e seus familiares é importante, expor todos os riscos a que aquele ato está sujeito, pedir exames adequados e atualizados, avalia-los, com isso possibilita o planejamento da medicação mais adequada para aquele ato anestésico, diminuindo a possibilidade de danos. Zelo para com o paciente faz parte da atividade médica, muito embora e apesar de todos os cuidados, um resultado não esperado ainda possa acontecer.

 

 

 

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